quinta-feira, 2 de outubro de 2025

CRÔNICA | A importância (não) dada ao Conselho Tutelar

O telefone do plantão toca no Conselho Tutelar. Uma das conselheiras atende, e é mais um pedido de ajuda, mais uma denúncia, mais uma família em conflito. Do outro lado da linha, quase sempre, há silêncio misturado com medo. Do lado de cá, há conselheiras com pastas cheias de casos, prazos correndo, visitas marcadas e uma sensação constante de estar apagando incêndios com baldes furados.

No entanto, quando alguém comenta sobre o Conselho Tutelar na rua, no ônibus ou na fila do supermercado, a frase costuma vir carregada de preconceito: “Ah, as conselheiras não faz nada. Só aparece para tirar criança de casa.” Como se o Conselho fosse um vilão de novela, entrando em cena apenas para separar mães e filhos, para “atrapalhar” a vida das famílias. Poucos lembram que ele existe não para destruir lares, mas para tentar reconstruí-los, quando já estão caindo aos pedaços.

Desde que passei a acompanhar o trabalho do Conselho Tutelar, devido a meu vínculo com a Secretaria Municipal do Desenvolvimento Social de Santo Antônio da Partulha/RS, percebi que a verdade é que o Conselho Tutelar é chamado onde a infância foi esquecida, onde a criança vai dormir sem jantar, onde o grito virou rotina, onde a violência, a negligência ou a indiferença já moram há muito tempo. Mas essa parte não aparece na opinião popular. É mais fácil achar que o Conselho “não serve para nada”, do que admitir que vivemos em uma sociedade que ainda falha em proteger seus menores.

Talvez, falte à população enxergar que as conselheiras — tantas vezes julgadas como burocratas acomodadas — são, na prática, pontes frágeis entre a dor e a justiça. Eles não têm superpoderes, não carregam varinhas mágicas, não podem prometer finais felizes. porém podem ouvir, registrar, encaminhar e insistir. E isso, em um país que, tantas vezes, faz de conta que não vê as feridas da infância, já é um ato de resistência.

É irônico então: cobramos que o Conselho faça milagres, mas não lhe damos estrutura, respeito ou sequer o benefício da dúvida. É uma importância não dada a ele.

No fim das contas, pode ser que a maior injustiça com o Conselho Tutelar seja esta: não percebermos que, quando ele é chamado, é porque já falhamos como comunidade. E, ainda assim, preferimos acusá-lo de omissão a reconhecer a nossa.

Nenhum comentário:

Postar um comentário