O sonho de Vira sempre foi que o filho Leandro, Leô, fosse
par de alguma debutante na cidade. Quando pequeno, o guri tinha que saber
portar-se nas festas, comer direito, vestir-se bem. Um verdadeiro contraste com
a mãe, grossa até não poder mais. E o pai então? Pior impossível!
Cresceu nas poucas festas da alta sociedade decadente,
sempre interpretando bem o papel de bom moço, de inteligente, correto e mais
outras coisas. A mãe sempre junto, mas calada. Se abrisse a boca, não teria assunto
para entoar.
Enfim, quando o diabo estava no 3º ano, surgiu a
oportunidade. A vizinha, Maria do Dileu, convidou Leandro para ser par da
filha, Katiele, no debut de outubro. O guri nem abriu a boca, Vira saltou na
frente: “Vizinha, ele aceita, sim, está tudo certo. Não se preocupe”.
Era julho ainda, mas Leandro já estava vendo a roupa de
pinguim para o evento. Não tinha nada que escolher. Era o mesmo traje sempre.
Mas Vira queria algo diferente, algo que destacasse o guri dos outros pares.
Até perguntou para o melhor amigo do filho, Julei, o que poderia ser sugerido,
colocado, inventado, qualquer coisa. Depois de breve discussão, bate-boca e
outras verbidades, resolveram pôr uma rosa champagne no traje de Leandro.
Vira reservou o salão de beleza três semanas antes. Abriu a
mão – a muito custo – e se propôs a fazer barba, cabelo e bigode. O marido,
Muarai, nem bola para o que era tão aguardado pela mulher, mas deixou alugado o
smoking. Curiosa, Vira queria saber do vestido de Katiele. Empenhada, depois de
escalar a casa da vizinha com uma escada de lavar forro, conseguiu ver a cor:
era champagne. “Muarai, nem sabe: o vestido da Katiele é champagne, que nem a
flor do Leandro. Legal, né?”, contou faceira ao marido, que estava estagnado na
poltrona, fumando, comendo salgadinhos e que respondeu com um “chega-pra-lá”
com a mão.
O bendito baile chegou. Ameaçava chover, e Vira punha as
mãos nos cabelos alisados para mantê-los bonitos. Fizeram as filas dos pares.
Desfizeram em seguida. Uma debutante queria fazer xixi. Leandro se afastou para
a saleta ao lado do rol principal do clube. Cinco minutos passaram. Dez também.
Vira foi atrás do filho. Que decepção: ele beijava na boca o amigo Julei. Ela
na sabia se chorava, se batia nos dois, se gritava. Optou por correr até lá e
separar os dois. Neste momento, o decorador e organizador do baile chamou as
debutantes e os pares novamente. Irritada e com muitas lágrimas contidas, Vira
pisou com raiva o pé do filho, que se desequilibrou, caindo na parede de pano
que separava a saleta do salão. O rapaz foi parar na pista. Os convidados todos
olharam. Julei – que era primo de uma debutante – correu para acudir o
namoradinho, dizendo: “Leô, amor, está tudo bem?” O silêncio tomou conta do
salão. “Namoradinho?”, disse uma na ponta. “Jesus, o filho da Vira é gay. Que
vergonha!”, exclamou a mãe de uma coleguinha do guri. “Que que tem? Deixa o
cara fazer o que quiser!”, disse um outro pai meio bêbado.
E o falatório tomou conta do salão. A debutante Katiele
chorava de vergonha, as outras escondiam o riso com as mãos nos rostos. O baile
parou. Em meia-hora, Leandro estava apanhando do pai e da mãe em casa; Julei
tinha batido o carro ao sair do salão e fora para a delegacia; e a mãe de
Katiele infartou indo para o hospital.
O par desapontou; o sonho esvaiu-se em menos de duas horas.
No dia seguinte, Vira parou de tomar a pílula. Queria
engravidar novamente e sonhar com um par de debutante perfeito.
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