Como não consigo me controlar, resolvi meter o meu texto em mais uma
falsa polêmica. Há pouco tempo, o Grêmio Literário Patrulhense, por iniciativa
do escritor Maurício Collar, publicou Prosa na Varanda, que, pelo que fiquei
sabendo, deverá ser anual. Bem, numa das crônicas, o escritor e professor
Márnei Consul, autor de cinco livros, escreveu um trecho que gerou críticas à
sua pessoa: “Isso sem falar na arrogância de juízes e advogados, reles
bacharéis, que se intitulam doutores (...)” (COLLAR, 2013, p. 73).
Pois é, qualquer um sabe que Márnei está com a razão. Todos os
advogados, ou quase, autodenominam-se doutores, mas quase nenhum deles o é de
fato. Ouvi falar de que havia uma lei do século XIX que daria o direito aos
advogados de ser chamados dessa forma. Então, fui pesquisar na internet e
descobri um texto do jurista, membro vitalício do Ministério Público da União,
doutor em
Direito Internacional e Integração Econômica pela Faculdade
Estadual do Rio de Janeiro, mestre de Direito Público e Ciência Política pela
Universidade Federal de Santa Catarina e bacharel em Direito, entre outros
títulos. O senhor se chama Marco Antônio Ribeiro Tura. Ele disse que, segundo a
lenda, Dona Maria, a Pia, teria baixado um alvará pelo qual os advogados
portugueses (olha, apenas os portugueses, não os brasileiros) deveriam ser
tratados como doutores nas Cortes Brasileiras (e somente nelas). Em 2000, o
Senado Federal presenteou o doutor Marco Antônio (doutor de verdade) com as
mídias digitais contendo os atos normativos desde a Colônia (mais de 500 anos
de história normativa) e nada se encontra desse alvará. Portanto, ele nunca
existiu. É apenas lenda. A Lei de 11 de agosto de 1827, responsável pela
criação dos cursos de Direito no Brasil, em seu nono artigo, afirma que as
pessoas que se formarem nos cursos jurídicos deverão ser chamadas de bacharéis.
“Haverá também o grau de doutor, que será conferido àqueles que se habilitarem
com os requisitos que se especificarem nos Estatutos”, comenta. Esses requisitos,
hoje, significam quatro anos de graduação, dois de especialização, três de
mestrado e seis de doutorado, mais ou menos.
Portanto, para se chamar de doutor, o advogado deve estudar em torno de
15 anos e, como o Márnei disse na sua crônica, quase 100% deles estudam quatro
anos e exigem ser chamados de doutor. E os outros nove anos de estudo ficam
onde? E isso não é arrogância?
Texto de Eduardo Jablonski, mestre em Letras pela UFRGS