sábado, 13 de setembro de 2025

CRÔNICA | Duas vidas na semana

Acorda-se cedo. O despertador do celular invade o silêncio do quarto com sua insistência mecânica e melódica. Café rápido, troca de roupas, ajeitada na cara, e lá vamos nós para mais um dia de trabalho. Segunda, terça, quarta-feira… A sequência quase hipnótica parece não ter fim. Todos correm, apressados, com olhares fixos em telas, papéis e metas. Trabalham para pagar contas, pagar sonhos, pagar tempo. Mas que tempo é esse que se paga com esforço e estresse, apenas para esperar que chegue o fim de semana?

Ah, o sábado e o domingo! Como se fossem o oásis prometido no deserto da semana, esses dois dias são idolatrados como um prêmio. Durante eles, tudo parece permitido: passeios, encontros, descanso. Mas há um preço invisível embutido em cada risada de sábado à tarde: os cinco dias anteriores, gastos em ansiedade, pressa e tensão. É um ciclo que aprisiona, um ritual que molda vidas na expectativa de apenas dois dias de liberdade.

O paradoxo é cruel. Trabalhamos para viver melhor, mas a vida que se vive melhor é comprimida em quarenta e oito horas. Quantas conversas são interrompidas, quantos sorrisos se perdem, quantas manhãs de sol são ignoradas em função de relatórios e reuniões? A saúde, o sono e a paz interior tornam-se moedas de troca, enquanto a felicidade parece adiada, sempre para depois.

Talvez, a qualidade de vida não esteja em quantos fins de semana conseguimos aproveitar, mas em aprender a enxergar o valor de cada momento: uma pausa no trabalho, um café com um amigo, a leitura que nos acalma ou a caminhada pelo bairro. A vida não precisa ser um aperto de parafusos de segunda a sexta para, depois, explodir em dois dias de lazer. A vida é feita de minutos, e cada minuto merece ser vivido.

Se nos matamos trabalhando apenas para curtir dois dias, talvez, seja hora de repensar: trabalhar para viver ou viver para trabalhar? Afinal, a felicidade não se compra com horas extras, nem se acumula em folgas. Ela se encontra na arte de transformar cada dia em algo que valha a pena, não apenas em esperar pelo sábado.

Em síntese, fica a pergunta: é possível unir as duas vidas que temos durante a semana (uma de segunda a sexta e outra no sábado e no domingo)? O que você me diz, leitor?

quarta-feira, 3 de setembro de 2025

CRÔNICA | O peso do giz e da frustração

No dia 2, a postagem abaixo apareceu a mim como lembrança no Facebook. Fiz o comentário/desabafo em setembro de 2016, sendo que, três meses depois (no final de dezembro), eu me exonerei da educação pública estadual. Novas curtidas e novos comentários surgiram na postagem. Imagino, inclusive, que algumas pessoas pensaram que fiz tal postagem nos dias de hoje. Por isso, senti-me motivado a fazer uma crônica sobre o assunto, lembrando aqueles últimos meses meus como docente.

Havia dias em que o quadro negro/branco parecia mais pesado do que nunca. O giz/pincel atômico riscava as letras, mas não alcançava os ouvidos. E o professor, coitado, insistia. Insistia como quem tentava remar contra a correnteza — e a correnteza era forte, levava meninos e meninas embora, cedo demais.

“Mas por que o uso do verbo no pretérito imperfeito, Márnei? Não é mais assim?”

“Infelizmente, em muitos casos, ainda é. Vou mudar o tempo verbal então”.

Eles chegam com os olhos cansados, às vezes vermelhos, às vezes distantes. O recreio não é mais de bola de gude ou figurinhas; é de fumaça, de pó, de um mundo que os adultos fingem não ver. “A lei os protege”, dizem uns. Protege, sim, mas de quê? Dos próprios erros, não. Da ausência de casa, muito menos. Dos pais que, ao invés de porto viram tempestade, muito menos ainda.

Na escola, a porta é sempre aberta. Tem de ser. O professor recebe todos — até quando sabe que a sala de aula não é o lugar que eles escolheram estar. Dá conselho, dá bronca, dá exemplo... Mas, por vezes, a palavra bate e volta, como bola contra muro.

E ele, o educador, repete para si mesmo como mantra: “É frustrante”. Porque ensinar deveria ser como plantar sementes, mas há dias em que é só assistir à ventania levando tudo antes de germinar.

No entanto, no fundo do olhar cansado do professor, ainda sobra uma teimosia. Porque se há algo que educador aprende cedo é que, mesmo diante da frustração, sempre vale a pena insistir. Até porque, entre as sementes ruins, há sempre aquelas que resistem.

De 2017 em diante, passei a ter outra profissão: funcionário público municipal. Entretanto, não consegui abandonar a vontade de ensinar, fazendo isso em escola de cursos livres por vários anos e, atualmente, por meio do projeto “English for a better age”. Posso afirmar que nunca mais voltarei às salas de aula da educação regular? Não. O ditado clichê “Nunca diga nunca” é um dos mais verídicos que existem. Além dele, “O tempo é o senhor da razão” é muito válido. E já faz* dez anos. Who knows...

* Não é "fazem". "Fazer", no sentido de tempo, fica no singular.